Crónica do Porteiro Financeiro: Ou, um Guia para a Inutilidade da sua Corretora

Nesta nossa São Paulo, onde a cada esquina brota uma nova startup que promete reinventar a roda e um novo café que serve um pingo de cafeína pelo preço de um alqueire, floresceu também uma das mais ruidosas e inúteis indústrias da nossa era: a da corretora de valores "para todos".

É uma comédia magnífica. Sob a bandeira esfarrapada da "democratização dos investimentos", montou-se um circo de proporções épicas. Abriram as portas do casino à plebe, deram-lhe uma aplicação colorida para o telemóvel e convenceram-na de que, com dois cliques e a sabedoria de um influencer do Instagram, qualquer um pode ser o próximo Warren Buffett. O resultado é o que se vê: uma legião de basbaques a comprar e a vender ações com a mesma estratégia com que se aposta no bicho.

E quem é o mestre de cerimónias desta farsa? É a figura enternecedora do "assessor de investimentos", essa nova profissão que consiste em ser o porteiro de um prédio de luxo.

Pense bem, a analogia é perfeita. O assessor, tal como o porteiro do seu prédio, é um rapaz extremamente solícito. Dá-lhe um "bom dia, nobre investidor!", abre-lhe a porta do aplicativo e tem sempre na ponta da língua a última fofoca do condomínio: "Ouvi dizer que o pessoal do 12º andar está a vender tudo e a comprar Fundo de Cripto-Misticismo Quântico".

Ele não entende verdadeiramente da estrutura do edifício (a macroeconomia), nem da engenharia que o sustenta (a análise fundamentalista). A sua sabedoria consiste em saber quem entra, quem sai e em recomendar o "produto da semana" que a administração do condomínio (a corretora) o mandou empurrar. "Temos aqui um COE, doutor, uma maravilha! Risco de atropelamento em Marte com retorno de caderneta de poupança. É o que todos os vizinhos estão a comprar!"

A sua independência é a do porteiro que aceita gorjetas de todos os prestadores de serviço: o gestor do fundo que paga o maior rebate, o estruturador do produto mais confuso, todos lhe molham a mão para que ele recomende os seus serviços aos inocentes moradores.

E assim vive o nosso "investidor democratizado": entregando as suas parcas economias aos cuidados de um porteiro bem-intencionado, que lhe oferece o último boato do mercado como se fosse o Santo Graal das finanças. Compra na alta, vende na baixa, paga comissão em todas as pontas e, no fim do ano, celebra o facto de ter perdido um pouco menos que o seu vizinho de porta.

Não se engane, meu caro. Você não tem um conselheiro, um guia, um "alfaiate financeiro". Você tem um rapaz educado que lhe abre a porta do casino e lhe deseja boa sorte. E a única coisa que está a ser "democratizada", nesta história toda, é a certeza do prejuízo.

Comentários

Postagens mais visitadas