Crónicas de um Espírito Insubmisso: Ao limiar desta modesta tribuna
Se o caro leitor, porventura, chegou a este recanto digital, é porque decerto partilha comigo de um tédio profundo, de uma fadiga de alma perante a ruidosa pantomima que se convencionou chamar de debate público nesta nossa pátria. Abre-se uma gazeta, ausculta-se um político, e o que se nos oferece é sempre a mesma e nefasta escolha entre dois pratos de igual indigestão.
De um lado, a sereia do socialismo, com seu canto dolente a prometer o paraíso na terra, contanto que lhe entreguemos a bolsa e a vontade; do outro, um nacionalismo caserneiro, de peito estufado e verbo tosco, que brande a bandeira com uma mão enquanto, com a outra, afaga os mesmos vícios estatistas que finge combater. Impõem-nos, pois, a optar entre a tirania dos comitês e a tirania dos quartéis. Entre o jacobinismo de Lula e o caudilhismo de Bolsonaro.
Pois eu, com a vossa licença, recuso-me a tomar parte em tão vil comédia. E estas crónicas que ora se iniciam são o modesto reduto de um espírito que não se verga a tão mesquinhas alternativas.
Mas quem é este vosso cronista?
Sabei que sou um homem que dedica os seus dias ao estudo das ciências económicas, essa disciplina tão maltratada pelos demagogos. O meu espírito foi formado não nas cartilhas do Estado-providência, mas sim na robusta e cristalina doutrina dos mestres austríacos, os insignes Mises e Hayek, que me ensinaram a ver no indivíduo o único e verdadeiro motor da civilização, e no mercado livre a mais engenhosa e augusta ordem que a humanidade concebeu.
Destarte, sou um liberal na bolsa e nos foros, cioso das liberdades de empreender, de contratar, de pensar. Porém – e aqui reside o paradoxo que confunde as mentes simplórias –, sou um conservador na alma e no lar. Tenho em alta conta as instituições que o tempo e a sabedoria dos séculos decantaram: a família, a fé, a comunidade, o respeito pela herança dos nossos avós. A liberdade, a meu ver, não é a licença para a anarquia dos costumes, mas a condição para que a virtude floresça num solo de responsabilidade moral.
Eis porque o meu desprezo se dirige, com igual vigor, a todo o espectro da nossa política. Abomino o delírio coletivista da esquerda; mas não me iludo com a direita populista, que, a coberto de um patriotismo de fancaria, cede aos mesmos apetites por poder e intervenção. E se olho com alguma esperança para os pampas argentinos, onde um arauto solitário chamado Milei tenta a hercúlea tarefa de ceifar as cabeças do leviatã estatal, é porque reconheço ali a coragem das ideias sãs.
No fundo de tudo, jaz a minha fé. Uma fé primeva, a de Cristo, que me dita a caridade e o livre-arbítrio como bússolas da existência. Mas meu espírito é inquieto, e não se furta a perscrutar outras veredas da alma, colhendo ecos de outras crenças que aportaram nestas plagas e que nos falam de reencarnação e justiça universal, lembrando-me sempre que a economia e a política são, em última análise, o palco onde se joga o drama da salvação ou perdição de cada alma.
E por que estas crónicas?
A razão é de uma clareza meridiana: para rasgar o silêncio cúmplice que assola os espíritos verdadeiramente livres. Para erguer uma modesta tribuna de onde se possa analisar os factos do dia sem as viseiras da ideologia dominante.
O propósito deste observatório será, portanto:
Comentar os sucessos da política e da economia com o bisturi afiado da doutrina liberal-clássica, despindo-os de sua roupagem enganosa.
Expor ao ridículo as falácias e as mentiras que, da esquerda à direita, servem sempre para justificar a expansão do monstro estatal.
Defender, sem tréguas, a Liberdade, essa dama tão formosa e tão vilipendiada.
Restaurar a honra de um conservadorismo assente na prudência e na tradição, e não no grito e na força bruta.
Não espere o leitor encontrar aqui o conforto das opiniões unânimes ou a segurança dos rebanhos. Encontrará, sim, o pensamento livre de um homem que se recusa a ser mais uma ovelha neste pasto de conformismo.
Se a vossa alma também se sente cativa entre as muralhas do pensamento único, sede bem-vindo a este cenáculo. A casa é vossa.
Com os meus melhores cumprimentos.
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